Mil Homens
literatura. música. arte digital.
longitudes. (XIX)

Raiva.
E eu não endoideci! Rasgam-se os lábios,
A pele secou, o cieiro, a energia violenta
De um grito a gritar.
Já sinto o sangue, o ferro, a vontade
De ser conquistado e recolhido num abraço
Íntimo, que me retenha.
Um momento, finda o momento e depois
Todas estas violências são acréscimos
Que se propagam na linhagem.
E eu não sei de antepassados, quem eram eles?
Mas sei-os como pequenos animais raivosos,
Porque o sangue é meu, era deles.
O ódio, o ódio é meu, era deles. A saudade,
Já consumi a saudade. E a raiva,
A raiva é hereditária; os homens nunca deixam de ser raivosos.
Medo.
A noite vem, vem a noite e acordo
A temer a morte. No escuro, no breu da madrugada,
Não me vejo e só me estranho.
Queria um porto onde chegar, um casebre
Juvenil, sem tijolo, só madeira tosca para
No silêncio, sossegar.
Mas não há sossego, não há silêncio,
E o cansaço é relativo porque não me deixa dormir
Só dormitar, logo desperto.
São os meus braços que me abraçam, não há mais braços.
É a minha voz que me grita, não há mais vozes.
É o meu medo que suspira, não há mais medos.
Os meus antepassados não estão cá;
Navego sem família. Nunca vou ser ninguém.
A morte é mais destemida do que eu.
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